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Mato Grosso do Sul na balança

  • Foto do escritor: MILENY RODRIGUES DE BARROS
    MILENY RODRIGUES DE BARROS
  • 23 de out.
  • 6 min de leitura

O estado ocupa o 6º lugar no ranking nacional de obesidade com 70% da população com algum grau de sobrepeso


Bruna Melo, Camille Rosa e Nathana Nunes


O aumento da obesidade em Mato Grosso do Sul deixou de ser apenas um dado estatístico e passou a ser tema de debate público. A Organização Mundial da Saúde (OMS) classifica a obesidade como uma doença crônica e um dos maiores problemas de saúde pública no mundo. Estima-se que mais de 1 bilhão de pessoas convivam com a condição, incluindo 650 milhões de adultos, 340 milhões de adolescentes e 39 milhões de crianças. No Brasil, segundo o Ministério da Saúde, 60% da população adulta já está com excesso de peso e 41 milhões vivem com obesidade.


Em Campo Grande, capital de Mato Grosso do Sul, 62,8% dos adultos têm excesso de peso, segundo o sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel) de 2023, colocando a cidade entre as sete capitais com maiores índices do país. No recorte estadual, os números são ainda mais altos: dados do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (Sisvan) mostram que mais de 70% da população sul-mato-grossense apresenta algum grau de excesso de peso. O Vigitel também aponta que o estado tem 24,3% de adultos obesos, ficando em sexto lugar no país pelo impacto econômico da obesidade e em primeiro em mortes atribuídas à doença.Já em 2024, a prevalência registrada pelo Sisvan alcançou 35,75% dos adultos, revelando um crescimento preocupante.

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Infográfico: Bruna Melo


O nutricionista Pedro Hernandes explica que a gordofobia está diretamente ligada ao afastamento das pessoas do tratamento. “Quando a gente pensa em gordofobia, a gente está pensando numa fobia contra uma pessoa gorda. Desde o momento que existe um preconceito, essa pessoa se afasta da possibilidade de buscar auxílio multiprofissional ou acolhimento familiar. Ela se sente num lugar sem saída”.


Para o especialista, o preconceito influencia o comportamento alimentar. “Meus pacientes, quando saem da dieta, muitas vezes sentem tanta culpa que desistem de retomar. Ao invés de apenas voltar para o plano alimentar, chutam o balde de vez e voltam muito pior”, explica.


Nutricionista Pedro Hernandes explica que o acompanhamento nutricional é essencial para emagrecimento com saúde. Foto: Camille Filetto
Nutricionista Pedro Hernandes explica que o acompanhamento nutricional é essencial para emagrecimento com saúde. Foto: Camille Filetto

Além da nutrição, o acompanhamento psicológico tem papel essencial no tratamento da obesidade. A psicóloga alimentar Cristiane Ribeiro reforça que a obesidade precisa ser entendida como uma questão multifatorial, assim, vai além da alimentação. “Nós não podemos reduzi-las a comer demais. Existem fatores metabólicos, ambientais, culturais, emocionais e psicológicos envolvidos. Além disso, as consequências que a gente pode colocar são ansiedade, depressão e baixa autoestima”.


A profissional ainda alerta sobre como a relação disfuncional com a comida pode ser um gatilho para transtornos alimentares e gerar mais culpa. “Quando a alimentação deixa de ser apenas nutrição e passa a servir para regular emoções ou punir o corpo, estamos diante de um comportamento alimentar problemático. É preciso buscar ajuda quando isso acontece”.


A médica especialista em Endocrinologia, Renata Antonialli, também chama atenção sobre a diversidade de fatores que levam a pessoa a chegar num quadro clínico de obesidade e destaca a importância do paciente se sentir confortável durante as consultas. “O preconceito piora a comunicação médico-paciente e leva muitas pessoas a evitarem consultas ou a se sentirem desmotivadas. O cuidado só funciona de verdade quando há acolhimento e respeito, melhorando engajamento e resultados”.


Antonialli chama atenção para o uso crescente de medicamentos para emagrecimento e explica a influência da pressão estética. Na maioria dos casos, o uso é por estética, mas o critério tem que ser clínico. “Essas medicações reduzem o peso e fatores de risco. Elas ajudam muito, mas não resolvem sozinhas. Saúde depende também de políticas públicas, alimentação acessível e promoção de movimento, além do cuidado clínico”, explica.


Entre as histórias de quem enfrenta a obesidade em Mato Grosso do Sul, está a de Rebeca Lopes, 23 anos, estudante e estagiária na Polícia Federal. Desde a infância, ela conviveu com a obesidade e com o sofrimento causado pelo bullying, vivendo experiências difíceis que marcaram sua relação com o corpo. “Eu lembro que quando eu voltei na pediatra, ela olhou para mim e falou assim: ‘Olha, você vai ficar sem braço, você vai ficar sem perna, você vai morrer’ e aquilo foi um trauma”. Rebeca também lembra do impacto de consultas médicas traumáticas, quando profissionais chegaram a dizer que sua saúde estava em risco, deixando lembranças dolorosas.


Antes e depois de Rebeca com seu processo de emagrecimento. Foto: Acervo pessoal.
Antes e depois de Rebeca com seu processo de emagrecimento. Foto: Acervo pessoal.


Hoje, a estudante percebe mudanças significativas em sua vida e usa as redes sociais para compartilhar suas conquistas. Embora ainda não siga o padrão de magreza imposto pela sociedade, Rebeca encontra motivação em objetivos próprios, conectando saúde e bem-estar. Ela não tem mais diabetes, deixou de usar medicação e recuperou ciclos menstruais regulares, melhorando sua qualidade de vida de forma concreta. “A sua própria motivação tem que ser você mesma”, diz.


A técnica de enfermagem e cuidadora, Ingrid Dias, de 43 anos, também decidiu enfrentar a obesidade de forma ativa. Há cerca de dois anos ela segue tratamento com reeducação alimentar e musculação. No início, pesava 152 kg e hoje, chegou aos 108 kg. “A obesidade é uma doença crônica de difícil tratamento, por muitas vezes pensei em desistir, pois achava que não estava tendo resultados.”


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Ingrid treina às 07h da manhã de segunda a sexta sem falta para continuar seu processo de emagrecimento. Foto: Camille Filetto e Acervo Pessoal


Ao longo do tratamento, a cuidadora conseguiu controlar problemas de saúde, como colesterol, triglicerídeos e resistência à insulina. Mas a luta não se restringiu ao corpo e Ingrid também enfrentou situações de preconceito. Ela lembra de momentos em que, ao sair com amigos, recebia olhares e comentários de outros grupos. “A maior situação de gordofobia que sofri foi ter saído com amigos e ao chegar no ambiente um grupo iniciou trocas de olhares e comentários. Porém nunca deixei passar”, relembra.


Hoje, Ingrid comemora as transformações na vida cotidiana e na autoestima. “O tratamento mudou 100% minha vida. Passei a ter mais ânimo, a autoestima mudou totalmente. Minha meta agora é 98 kg”.


A técnica de enfermagem Ingrid Dias começou o acompanhamento com treinador, após tentar se exercitar sozinha por sete meses. Foto: Camille Filetto
A técnica de enfermagem Ingrid Dias começou o acompanhamento com treinador, após tentar se exercitar sozinha por sete meses. Foto: Camille Filetto

O treinador Pedro Ruben, responsável pelo acompanhamento da técnica de enfermagem, acompanha de perto os desafios de quem busca emagrecer. Para o personal, a gordofobia não é o principal obstáculo. Ele observa que, atualmente, casos de preconceito são raros. O maior desafio é a busca por resultados imediatos, sem respeitar o tempo necessário para mudanças consistentes. “O que acontece muito é o aluno querer o resultado imediato. Não respeita o tempo para ter o resultado”, diz.


Ruben reforça ainda a importância do acolhimento, orientando os alunos a manterem foco e disciplina, e que os benefícios vão muito além da estética. “Atividade física moderada e uma alimentação adequada são fatores para longevidade e prevenção para doenças como hipertensão, triglicérides, diabetes, colesterol. Estética e resultado são consequências dos fatores executados diariamente”, explica o treinador.


O empresário e influenciador de saúde, Patrick Oening, 45 anos, com mais de 88 mil seguidores, lembra bem das oscilações que marcaram sua relação com o peso. Ao longo dos anos, passou por ciclos de ganho e perda de peso, uma experiência profundamente ligada à autoestima. “A minha história é justamente de altos e baixos, sempre foi de ganhar peso, reduzir peso. É muito movida pela autoestima mesmo”, conta.


Antes e depois de Patrick em seu processo de emagrecimento. Foto: Acervo pessoal
Antes e depois de Patrick em seu processo de emagrecimento. Foto: Acervo pessoal

Para Oening, a obesidade é resultado de múltiplos fatores, incluindo genética, metabolismo e pressão social. Ele vem de uma família em que várias pessoas já passaram por cirurgias bariátricas. Hoje, mantém disciplina e atenção ao corpo, sabendo reconhecer sinais de excesso ou inatividade. “Eu sei quando eu estou extrapolando muito, eu sei quando eu estou muito quieto que eu preciso me movimentar, porque assim, não basta a gente ir vivendo no modo aventureiro para sempre.”


As redes sociais têm se tornado um terreno fértil para a insegurança, por isso filtrar o que é visto nas telas é tão importante. “As pessoas estão cada vez mais se comparando e idealizando o que o outro tem oferecido nas redes sociais, na mídia, como sendo belo, como sendo ideal, como sendo um padrão estabelecido pela sociedade”, afirma a psicóloga.


Vídeos que incitam a gordofobia e tratam a obesidade como escolha ainda são um obstáculo, como lembra Rebeca, que hoje usa as redes sociais para incentivar outras pessoas. Ingrid comemora a recuperação da saúde e da autoestima, Patrick mantém disciplina para não voltar aos ciclos de peso, e o treinador Pedro Ruben reforça a importância do acolhimento. Histórias diferentes que revelam os desafios da obesidade e do preconceito que ainda existem.




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