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Trinta segundos para comprar: onde nasce o hiperconsumo

  • Foto do escritor: MILENY RODRIGUES DE BARROS
    MILENY RODRIGUES DE BARROS
  • há 7 dias
  • 6 min de leitura

Quando as redes sociais de vídeos rápidos deixam de ser espaço de recomendação e viram uma vitrine


Brunna Brondani, Mariana Viana, Rebeca Ferro e Sarai Brauna


O TikTok ultrapassa um bilhão de usuários ativos no mundo. O aplicativo foi criado em 2016 para ser uma rede social para criar e compartilhar vídeos curtos. E entre dancinhas, trends e humor, algo cresce nessa rede social: o hiperconsumo. Com investimento por parte das marcas, cada vez mais influenciadores passaram a divulgar não apenas suas rotinas, ou conteúdo, mas também produtos de todos os tipos. As redes que começaram como espaços para o diálogo e entretenimento tornaram-se vitrines para o consumo quase imediato.


A “For You” do TikTok é um espaço personalizado na tela principal em que o usuário recebe os vídeos que mais se encaixam com suas curtidas, tempo de visualização e interações. A ferramenta tem como objetivo apresentar novos conteúdos e criadores a partir das preferências do usuário, criando a sensação de que cada feed é único. Segundo especialistas, a fórmula busca manter o usuário preso ao aplicativo, já que o próximo vídeo é pensado sob medida para a permanência de quem acessou o aplicativo.


O professor doutor em Ciência da Computação da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Francisco Eloi de Araújo, explica que o algoritmo é utilizado nas redes sociais para coletar as informações dos usuários e assim assimilar seu perfil de comportamento, possibilitando a entrega de anúncios, vídeos e posts relacionados. “Em princípio, o consumo pode até não ser tão ruim quanto parece, porque o algoritmo avalia quais são os gostos do usuário, e oferece o que ele mais gosta. Começa a ser um pouquinho mais perigoso quando a plataforma transforma tudo isso numa bolha em alguns assuntos, políticos, por exemplo, que você tem a sensação de que todo mundo pensa igual a você”.


A ferramenta deixou de ser apenas um espaço de descoberta de conteúdo e passou a operar também como um shopping personalizado, em que cada rolagem é uma sugestão de compra. O algoritmo entende não só o que diverte, mas também o que desperta desejo de consumo. Na prática, o feed assume um papel mais ativo: não é mais o usuário que procura o produto, é o produto que encontra o usuário. Esse processo cria um efeito de hiperconsumo em tempo real. Um vídeo de trinta segundos pode converter visualização em venda. E tem muita gente atenta a isso.


Atualmente o TikTok vai além da recomendação e da vitrine. Com a criação da TikTok Shop em maio de 2025, o usuário não precisa mais sair do aplicativo para procurar o produto divulgado, nem para realizar a compra. A plataforma integra o feed com um mercado, permitindo que as pessoas consigam achar os produtos apresentados na tela e com poucos toques consumir.


Essa relação entre as redes sociais e o consumo não é de agora. Em 2016, o Facebook começou com o marketplace próprio, o que abriu caminho para comércios do tipo dentro das redes digitais. Em março de 2018 chega o Instagram Shopping, que permitiu que empresas e influenciadores marcassem os produtos que divulgavam ou utilizavam para facilitar a venda direta na plataforma.


Gráfico produzido por Mariana Viana e Sarai Brauna
Gráfico produzido por Mariana Viana e Sarai Brauna

O cenário das vendas on-line teve o seu crescimento acelerado em 2020. Com a pandemia da Covid-19, e as regras de isolamento social em vigor, a quantidade de e-commerces cresceu de forma rápida no Brasil. Com as lojas físicas não essenciais fechadas e o consumidor em casa, as compras on-line passaram de alternativa para solução.


Mas nenhuma alcançou a velocidade da plataforma chinesa na viralização dos objetos. Além da loja dentro do aplicativo, o fenômeno dos produtos viralizados no TikTok ultrapassa as telas e se espalha por camelódromos, shoppings e lojas tanto presenciais quanto virtuais, como Shopee, Shein e Aliexpress, as últimas aliam uma fórmula: preços baixos e produto que chega na porta de casa.


De acordo com uma pesquisa publicada em julho de 2022 pela revista da Associação Brasileira de Supermercados (ABRAS), a Superhiper, 87% dos brasileiros já compram on-line e, cada vez mais, aderem à ideia do modelo Social Commerce, vendas que ocorrem dentro das próprias redes sociais. O dado comprova como o ambiente digital deixou de ser apenas um espaço de interação e se consolida também como um mercado.


O economista especialista em consumo e produção sustentável, Pedro Henrique Franco, explica que essa tendência se conecta com a vida moderna, devido à mistura entre entretenimento e compra. “Isso facilita, já que você está rolando seu feed e encontra uma propaganda assertiva, personalizada e em poucos cliques e segundos, já finaliza a compra sem sair do aplicativo. Essa combinação de praticidade e exposição constante cria um hábito e fideliza o consumidor, não na loja, mas nesse processo de consumo”.


O especialista afirma ainda que o preço de referência para o mercado é definido online, e que o cliente se baseia nele antes de ir comprar em alguma loja física. “Algumas pessoas entram nos marketplaces para ver como está o preço, e se é mais barato do que na loja física ou terem outras opções que às vezes naquela loja, o estoque não está tendo”.


Barato e na porta de casa: a fórmula da viralização

O economista explica ainda que umas das ferramentas usadas para impulsionar as vendas e o hiperconsumo são os estímulos contínuos. “Alguns gatilhos de promoção são promoção relâmpago e cupom de frete grátis. Há outras ferramentas de tempo, como ‘só nos próximos 10 minutos você vai conseguir comprar por tal preço’, e outras notificações personalizadas. Os algoritmos das redes também direcionam bem o produto para os consumidores, o que acelera a decisão e aumenta a compra por impulso e muitas vezes sem planejamento’’, explica.


Promoção não é algo novo. A estratégia de venda ‘leve três no preço de dois’ faz com que seu consumo seja validado. Franco explica que a possibilidade de realizar as compras on-line foram essenciais para que parte da população tivesse acesso à compra de forma que antes não podiam. “As plataformas democratizaram o acesso a produtos baratos, e dessa forma pressionaram o comércio local a tentar vender mais barato os produtos brasileiros”, afirma.

O economista aponta ainda que é necessário entender os motivos pelos quais esses produtos internacionais são mais baratos. Para ele, o fato está relacionado à diferença entre as legislações de outros países com a do Brasil, como as legislações trabalhistas e ambientais. “É interessante que o consumidor se atente a isso, se ele concorda com algumas práticas que são muitas vezes desiguais na competição com o mercado brasileiro”, aponta.


Os efeitos psicológicos do hiperconsumo através do TikTok

A psicóloga Danielly Silva, especialista em Terapia Cognitivo-Comportamental, aponta que as redes sociais agravam e potencializam um problema já existente, o hiperconsumo. “O hiperconsumo já é prejudicial por si só. As redes sociais, no entanto, potencializam esse comportamento. Isso ocorre porque nelas temos contato com pessoas comuns, semelhantes a nós, o que facilita a conexão com o estilo de vida que essas pessoas exibem”, explica.


A especialista explica que o hiperconsumo mediado pelas redes sociais pode ser prejudicial não apenas pelas compras impulsivas, mas também pela possibilidade do comportamento ser uma forma de esconder emoções, angústias e inquietações. “Esse tipo de consumo desenfreado pode impedir o enfrentamento real de problemas complexos e retardar a tomada de consciência sobre comportamentos disfuncionais”, aponta.


Seja nos shoppings ou na For You, o hiperconsumo de produtos virais mostra que a lógica de mercado se reprogramou, e mudou também o comportamento dos consumidores. “Acredito que as tecnologias digitais, de forma geral, estão transformando o comportamento do consumidor. Hoje, os consumidores estão mais informados sobre produtos e serviços: pesquisam avaliações, reviews e diferentes fontes antes de comprar”, explica Martins.


A influência das tendências

No Brasil, a adesão às tendências acontece de forma intensa. Não à toa memes sobre Labubu, pistache, morango do amor e bobbie goods encheram as redes sociais. Até com a criação de uma música, que cita todas essas tendências, que no dia 17 de setembro de 2025 contava com 26 mil vídeos publicados com ela no TikTok.

A tendência das redes sociais influenciou o consumo de livros de colorir conhecidos por “Bobbie Goods”. Imagem: Helena Fuzineli.
A tendência das redes sociais influenciou o consumo de livros de colorir conhecidos por “Bobbie Goods”. Imagem: Helena Fuzineli.

As tendências não afetam apenas os adultos, alcançando às crianças, ainda que a plataforma tenha limite de idade de no mínimo 13 anos para a inscrição. Segundo o levantamento TIC Kids Online Brasil realizado em 2023 pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), essa plataforma é a mais utilizada entre as crianças e adolescentes de 9 a 17 anos no Brasil.


Mãe de uma criança de 9 anos, Daniely Santos, 39, consumiu diversos itens que estavam em tendências nas redes sociais como morango do amor, capivara de pelúcia, copo Stanley, Bobbie Goods, Pop It, fone de ouvido de gatinho, entre outros. “Eu noto que é aquela questão momentânea da novidade. Passou o tempo da novidade, vem a perda de interesse”, conta. A influência, além de vir dos amigos da escola, também vem dos youtubers de conteúdo infantil assistidos pela filha.








 
 
 

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