A força feminina que transforma militância em política institucional
- CAMILA RODRIGUES CUNHA
- há 2 dias
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Isabela utiliza a base do conhecimento e a vivência na periferia para redefinir o espaço da mulher e da juventude na esfera política
Por: Isadora Ventura e Mariani Lanza

Isabela e sua filha Olívia durante a entrevista. Foto: Mariani Lanza (@auxyeuxdemariani).
calor intenso de Campo Grande se manifesta sobre o campus da UFMS (Universidade federal de Mato Grosso do Sul), incendiando o asfalto e tornando o ar pesado. Ainda assim, mesmo diante de um clima opressor, o jardim do Centro Acadêmico de Jornalismo se tornou palco e testemunha de entrevista com uma mulher símbolo de força e resistência política. Isabela de Paula Nantes, 29 anos, conhecida popularmente como Isa Nantes, é advogada formada pelo Prouni (Programa Universidade para Todos), mãe, esposa, cristã e militante pela causa das juventudes. A jovem personifica a convicção de que o desejo de mudança é o motor da juventude. Construiu seu caminho desde a adolescência e alcançou o topo da representação jovem ao presidir o Conselho Estadual da Juventude de Mato Grosso do Sul. Mente brilhante fruto de escola pública, iniciou a faculdade aos 16 anos e se formou em Direito aos 21, uma trajetória que sublinha a resiliência desde cedo.
INÍCIO DA JORNADA
O despertar para a política veio de forma orgânica, a partir do Parlamento Jovem Municipal, o primeiro espaço que compôs. Foi lá que ela finalmente encontrou seu propósito. “Eu tentei várias coisas na minha vida, mas em nenhuma eu me encontrei tão bem quanto nesse espaço de construção política”. Sua conduta é pautada não no confronto, mas no diálogo, na conversa e na construção, diferenciando-a da militância puramente conflituosa.

Nantes quando adolescente, participando do Parlamento Jovem Municipal de Campo Grande. Foto: Acervo Pessoal.
A jornada rumo ao protagonismo político foi um embate contra a invisibilidade e a falta de referências femininas que, assim como ela, saíram da periferia, estudaram em escola pública, se formaram com bolsa e chegaram a esses espaços sem apadrinhamento. Diante desse cenário, a advogada lidava com um sentimento de ilegitimidade e com o peso da invisibilidade, “é como se eu sentisse que esse lugar não é pra mim”. O desconforto declarado por Isabela, não é um caso isolado, de acordo com dados de 2023 e 2024 do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), no país apenas cerca de 15% dos espaços de poder são ocupados por mulheres. Dado alarmante quando comparado com o cenário do eleitorado brasileiro, no Brasil são cerca de 52,47% de eleitoras, e em Mato Grosso do Sul (MS) cerca de 52,9%. Essa barreira imposta pelo sistema, é um obstáculo driblado por Isa Nantes que diz “a gente abre os nossos caminhos”. Seu objetivo atual é claro: ser inspiração para outras meninas que vieram de contextos parecidos , forjando uma nova linhagem de poder para mudar a história política, principalmente das mulheres no nosso estado.
Com brilho nos olhos, a militante relata que chegar à presidência do Conjuv-MS (O Conselho Nacional de Juventude), foi fruto de muitos esforços, ela atualmente representa a sociedade civil no conselho e utiliza de sua posição para reforçar a importância da participação dos jovens na construção de políticas públicas que impactam diretamente suas vidas.
Atrelado a isso, a sua formação acadêmica e a sua paixão pela luta. “A minha formação teve grande parte nisso, eu sou pós-graduada em Direito Público, e eu empresto muito disso para a gente construir as novas leis pro Estado que atendem à juventude, para reorganizar a legislação”. Essa precisão técnica é o que permite a Isa Nantes dar forma às demandas da juventude, transformando a paixão em estratégia. “Luta sem estar instrumentalizada com conhecimento, infelizmente, é enxugar gelo.”

Isabela relatando sobre sua trajetória de luta. Foto: Mariani Lanza (@auxyeuxdemariani).
VIDA POLÍTICA E MATERNIDADE
Embora a militância e as demandas da advocacia e da presidência do conselho tomem boa parte de seu tempo, Isabela lida com as obrigações da maternidade e do casamento. “Eu descobri que eu estava grávida em janeiro de 2022, que foi o mesmo mês que eu entrei no Conselho”. Em meados de agosto de 2022, a chegada de Olívia, sua filha, tornou a maternidade indispensável em seu ativismo, adicionando uma camada de urgência e sensibilidade à sua missão.
Infelizmente, a maioria dos espaços — sejam eles políticos ou não — não estão preparados para receber as mães e seus filhos, sendo necessária uma rede de apoio.
Olívia tem 3 anos, porém ainda não está na escola, já que assim como milhares de crianças do município, aguarda por uma vaga nas creches públicas. “ A gente sabe que existe um déficit de vagas, com mais de 5 mil crianças na fila de espera, e a Olivia também está nessa fila aguardando uma vaga”. Enquanto a vaga não chega, Isabela conta com o apoio de seu marido e de sua avó, que se revezam nos cuidados da pequena enquanto a advogada precisa cumprir seus trabalhos. Quando não há a possibilidade de sua filha ficar com outras pessoas, Isa leva Olívia para os locais. O cenário da entrevista se tornou um grande exemplo. Enquanto Isabela era entrevistada, a pequena desvendava o jardim, interagia com a câmera e sua mãe, e conversava com estudantes contando sobre sua paixão pelo balé e por filmes de princesas.
O ato de levar a criança, seja para uma simples entrevista ou para reuniões oficiais do conselho, não é uma conveniência, mas uma militância ativa. A líder expôs a razão para essa barreira sistêmica “é tudo pensado para que elas não estejam lá”. A presença de crianças é tratada como um incômodo e a estrutura é escassa. Isabela menciona o Espaço Kids na Assembleia Legislativa que, mesmo existindo, “quase nunca tem gente lá”, tornando-o um símbolo vazio. Na Câmara Municipal, esse local é completamente inexistente.

Olívia em protesto contra a PDL N°3. Foto: Acervo Pessoal.
Mesmo assim, Isabela leva essas situações com leveza e as vê como positivas de certa forma, já que levar Olívia para esses locais proporciona ensinamentos para a criança, mostrando que as mulheres, especialmente as mães, pertencem a esses locais de poder, mesmo que a estrutura tente expulsá-las. “É necessário para ela compreender o espaço em que está”.

Isa e Olívia juntas durante a entrevista. Foto: Mariani Lanza (@auxyeuxdemariani).
Mesmo com todas as dificuldades, Isa Nantes, acredita que a maternidade mudou seu olhar perante as causas que defende. “A maternidade me tornou muito mais sensível a essas lutas, e me trouxe a possibilidade de fazer muito mais coisas”. O fardo de ser mulher mãe-militante é, paradoxalmente, a sua maior força motriz, transformando a necessidade pessoal em um imperativo político para reformar as estruturas de poder.






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