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Brasil, país da magia multicultural

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Cada vez mais brasileiros se assumem bruxos e mudam o sentido preconceituoso da palavra

Emilly Nunes e Eliel Dias




Nove horas da manhã. Depois de um farto café, a mãe faz as tarefas domésticas: varrer a casa, botar roupa para lavar, colocar a carne na panela de pressão. Um som baixo parecido com um mini engasgo e uma audível reclamação tira seu foco da cozinha. O bebê está com soluço, e está ficando irritado. Seus bracinhos balançam de cima para baixo dentro do carrinho e o choro de frustração começa a sair, interrompido pela avó, que pega o bebê em um braço e coloca a latinha de cerveja na bancada da cozinha. Ela leva a criança para o jardim e procura uma folha pequenininha. Do pé de jabuticaba, ela pega uma folha, lambe, e coloca na testa do neto. O soluço parou.

Por todo o Brasil, o povo usa jeitinhos para lidar com uma variedade de situações da vida e do dia a dia. Desde limpar a casa com sal grosso a ter um pé de espada-de-São-Jorge, as superstições estão inseridas na cultura brasileira, formada por várias tradições e costumes dos povos que compõem o país. Em uma visão ocultista, o Brasil é um país rodeado por magia.

Mas, todo mundo sabe que quem faz magia e feitiçaria são as tão temidas e malvadas bruxas. As avós brasileiras devem ser grandes magas poderosas depois de todas as folhas cuspidas que colocam nas testas dos netos.

Quem são as tão temidas bruxas, então? Mulheres e homens comuns, com uma pitadinha de magia em suas vidas. Aster Perpetua, seu nome na Internet, de 31 anos, é uma autodenominada bruxa. Criadora de conteúdo digital, ela fala sobre a cultura brasileira no ocultismo, utilidades e aplicações medicinais de plantas nativas. Em sua jornada de aprendizado, além dos livros, se deparou com vários influenciadores, vários conteúdos e informações novas.

“Na internet existem muitos criadores de conteúdo falando sobre magia, cada um com a sua abordagem diferente. Mas uma coisa que essas pessoas têm em comum é que elas deixam claro que a sua prática é sua. Elas te dão sugestões, te dão conselhos, mas no final do dia deixam bem claro que você que decide, você que faz, você que vê o que acha melhor”.

Num "surto da pandemia" foi morar na Europa quando se deparou com o termo bruxaria. O que começou como curiosidade com um baralho de tarô que comprou, evoluiu a cada livro comprado. Quanto mais aprendia, mais percebia a semelhança da magia europeia e da magia brasileira.

“É muito semelhante – não igual – à magia que nós temos no Brasil, coisas que a gente aprende com a Umbanda, que foi uma grande mistura de práticas indígenas, práticas negras. Virou uma coisa única que só existe no Brasil”. Como tudo que há no mundo, se alguém quiser aprender sobre algo, é necessário ler tudo o que pode sobre.

“Pra entender a magia brasileira a gente tem que entender a história do Brasil, como que aconteceu o genocídio indígena, que ainda acontece até hoje, como que essas culturas foram apagadas, mas mesmo assim deixaram um pouco de herança nas crenças que ainda existem, como que o negro africano foi levado para o Brasil, o que que ele passou, os europeus, o europeu católico, os colonizadores e os imigrantes que vieram depois”, explica Aster. Para entender a magia brasileira é necessário compreender como todos esses elementos se juntaram e misturaram, como formaram o que há hoje. É essa receita histórica que formou a cultura brasileira.

Pequenos hábitos enraizados, como acender uma vela para um ente querido ou pular a fogueira na festa junina, fazem parte da porção de atos mágicos. “As pessoas têm certas práticas, mas elas nunca diriam que são bruxas, elas falam que são supersticiosas. O termo bruxa veio da Europa. As pessoas do Brasil, nossas mães e avós, não diriam que são bruxas, dirão que é o santo, é a fé, é o axé”.

Algo mágico e importante e característico no Brasil está inserido na Umbanda, vinda do Candomblé. As giras, as cerimônias que acontecem nos terreiros, estão presentes desde a infância ou a partir da vida adulta, são costumeiras para quem segue a religião. Apesar de hoje serem vistas majoritariamente com normalidade, essas cerimônias possuem uma energia poderosa que move os indivíduos. Uma magia, ainda que não seja chamada assim.

“A minha família sempre foi conectada à Umbanda. Desde criança eu ia no terreiro com a minha mãe. Era uma coisa que fazia parte do cotidiano, só que eu nunca tinha visto isso como magia, como uma coisa poderosa, que é tão nossa, da nossa cultura e identidade que muitas vezes a gente não percebe”.


“Bruxa!”


Os termos bruxa e bruxaria são originários da Europa, criados no início da consolidação do cristianismo para identificar mulheres que usavam a medicina natural para curar membros da suas comunidades e práticas de culto à natureza. Com o passar dos anos, se tornou uma desculpa para condenar qualquer mulher que colocasse um pé para fora do padrão de comportamento na época, ou, em casos escassos, culpar algum homem envolvido em intrigas de poder.

No século XV até meados do século XVII houve a caça às bruxas em quase toda a Europa, o que deixou um grande rastro de milhares de pessoas mortas e torturadas. Hoje, os pesquisadores chamam esse fenômeno social de “bruxaria européia”, para distingui-lo de outras manifestações similares.

A crença em bruxas é um conceito universal, surgido de diferentes nomes em diferentes culturas. De acordo com o pesquisador Jeffrey Burton Russell, há duas diferenças no que se chama feitiçaria ou bruxaria. A primeira é ligada a crenças e superstições, como práticas de curas, raízes ancestrais, propagado no fundo das populações, já a outra está relacionada a um culto organizado, geralmente referenciado como pacto com o demônio.

A bruxaria na Europa surgiu do imaginário coletivo através da união da figura da feiticeira, inserida em diferentes seitas ateias que surgiram nas igrejas católicas desde a Idade Média, e dos poderes maléficos associados a feitiçaria por irem contra a Igreja Católica. A partir daquele momento, a bruxa já não agia por conta própria, mas com o auxílio do inimigo da cristandade — o diabo — com o objetivo de desviar o praticante do caminho correto, principalmente em reuniões que possuíam o caráter de culto – os Sabás.

É sempre bom lembrar que o tipo de bruxaria que faz pacto com o diabo existiu apenas na imaginação do povo e das regras criadas pelas instituições de poder da época como a Igreja, nunca foi comprovado que qualquer um dos acusados de bruxaria realmente fez o pacto com o demônio, foram poucos os casos cometidas por mentes já influenciadas pelos inquisidores, e os doentes. A convicção da existência de bruxas na Europa se deu pela crença generalizada entre o povo e as instituições religiosas de poder.

Aqui no Brasil, a história era outra. Na tentativa da igreja católica de implementar a caça às bruxas nos tempos coloniais, a Inquisição voltou seu julgamento principalmente contra os judeus e novos-cristãos, apesar de terem havido acusações e julgamentos das propriamente ditas bruxas. Quem elas foram? Avós, senhoras viúvas ou solteiras com conhecimento do uso de ervas no tratamento de doenças e feridas, que pela experiência sabiam como fazer partos. Muito por conta de recursos médicos escassos, as práticas das curandeiras e parteiras eram incentivadas nas comunidades. Por que iriam condenar à forca e à fogueira a única chance que tinham de sobreviver à morte certa por febre?

Ainda assim, nem todas conseguiram se esconder da cruz do catolicismo. Houve algumas acusações das igrejas instaladas aqui no Brasil sobre as orações e benzeduras utilizadas para curas, proteção ou, ainda, para possuir o amor e atração sexual de alguém. A pesquisadora Laura de Mello e Souza dá alguns exemplos, como o de Antônia Maria, que foi condenada pela inquisição de Lisboa e levada até Pernambuco, acusada de adoecer a família vizinha após um exorcismo em que passaram a expelir dentes, ervas, espinhas de peixes e outras substâncias.

A oração que alegaram ter sido feita por Antônia era “Aqui te fervo o teu coração com quantos nervos em teu corpo estão. Com Barrabás, Satanás, com Lúcifer e sua mulher, todos se queiram juntar e no teu coração queiram entrar para que não possas estar, nem sossegar sem que a sentença a favor de (...) queiras dar, e tudo quanto te pedir queiras outorgar”.

Houve outro exemplo que foi a oração de Maria Joana, outra acusada de feitiçaria: “O sangue de Cristo de dou a comer, o leite da Virgem Santíssima te dou a beber, suspiros, ais e as dores que a Virgem Santíssima deu quando viu o seu amado filho morto, os mesmo ais, e as mesmas dores, e os mesmos suspiros dês tu por mim à hora que não vieres comigo falar”.

A verdade é que o preconceito e raiva direcionados a essas mulheres vêm do medo do satanismo. As caças às bruxas satânicas foram mais comuns em regiões que tinham mais influência europeia e tradição datada desde a Idade Média. Apesar de tudo, no contexto geral, o Brasil foi um país mais aberto para aceitação devido às várias correntes formadas no pensamento da população que proporcionam uma maior tolerância às práticas de bruxarias, pelos recursos escassos no ambiente e cenário colonial, e o incentivo de práticas naturais eram encorajadas, como a de curas, parteiras etc. Assim, qualquer conceito ou intolerância encontrados em outras sociedades não eram tão comuns aqui no país. Apesar da história brasileira com as curandeiras, muitas pessoas não veem com bons olhos a palavra bruxa.


O Brasil pagão que você não conhecia



Vila Pagã, no interior do Piauí


Brasil, um país laico e de diferentes religiões, com pessoas de diferentes fisionomias, valores e vidas. De tempos em tempos, algo novo surge, outras vezes algo já existente se torna conhecido como se fosse novidade. Uma dessas novidades não tão recente se encontra no Piauí. O que é? A Vila Pagã.

João Rafael Almeida Nolêto, mais conhecido como Rafael Nolêto, de 35 anos, é formado em Jornalismo e trabalha em Relações Públicas como coordenador de marketing de um grupo agroindustrial. Natural de Teresina no estado do Piauí, a Vila Pagã, localizada em José de Freitas, um município a 30 km de Teresina, é um projeto seu. Bruxo brasileiro, é um sacerdote e líder religioso do politeísmo Piaga ou Paganismo, tradição neopagã autóctone do Brasil.

Sua visão da bruxaria é ampla, motivada pela variedade de conceitos existentes no amplo mágico ocultista. “A bruxaria é um termo muito amplo, pois envolve várias práticas, que são assim denominadas, então ela não tem necessariamente uma ligação com a religião, um dogma específico, é um termo muito amplo. Você pode dizer que há bruxas que não possui religião, que há religiões como as wicca, onde se intitulam bruxas, temos os vários praticantes de várias vertentes do paganismo, que além de se considerarem pagão, também se consideram bruxos, por praticarem a magia a feitiçaria, que é essa manipulação da energia com um objetivos específico”.

O que seria o Piaga? No paganismo, piaga se consideram os recursos que a própria região lhe provê, as ervas locais, as inscrições rupestres, o que elas representam dentro do contexto da magia e como utilizar essas ferramentas mágicas. São as entidades da mitologia local, todo esse universo, todo esse patrimônio ancestral, ele é utilizado de forma mágica para o benefício próprio.

O movimento neopagão tem sua influência ao redor do globo, caracterizado por três pontos básicos: o politeísmo, um culto aos ancestrais e o culto ao ciclo da natureza. De maneira definitiva, todas as tradições pagãs têm uma conexão com o ciclo da natureza respectivo de seus biomas e ao culto aos ancestrais.

Há a ancestralidade da terra, ou seja, os antepassados que viveram em algum lugar específico a ancestralidade de sangue, vinda dos pais, avós e parentes, e a ancestralidade espiritual, que são os guias e guardiões que não tiveram necessariamente uma ligação de sangue, como nos casos da adoração aos romanos, apesar de não haver relação de sangue; a partir do momento que uma pessoa passa a cultuá-los ela cria essa conexão.

“Em alguns grupos, vários movimentos se empenharam na missão de resgatar a ancestralidade sagrada de suas regiões. Na Rússia, por exemplo, temos o paganismo eslavo; na Grécia, o Helenismo; os nórdicos pelo turismo e os organismos nórdicos. No Brasil, tivemos entre os anos 90 a 2000 uma ascensão das tradições neopagãs aqui no país, como o crescimento da wicca que é chamado de bruxaria moderna. Aqui no nordeste, mais especificamente no Piauí, tivemos esse resgate, essa construção do paganismo que denominamos de paganismo Piaga, que na língua originária, a dos indígenas, significa pajé, um sacerdote curador propagador de fé”.

Segundo Nolêto, o paganismo é falar com seu bioma, com sua terra, com sua identidade. Ele acrescenta que foi feito todo um estudo da mitologia, da arqueologia, do lendário popular, do folclore, foi montado um quebra cabeça para entender isso sob uma nova perspectiva e não olhar para esse folclore como contos, mas sim como parte da religião, como parte hereditária. Assim, ao longo dos anos foi se consolidando o paganismo Piaga, que hoje já é reconhecida como a primeira religião neopagã genuinamente brasileira.

Há diversas religiões neopagãs no Brasil, mas a única com os três conceitos, o politeísmo, o culto à natureza e o culto à ancestralidade, de forma organizada é o paganismo piaga. A Vila Pagã foi estruturada desde 2014 — e em continuidade nos dias de hoje — com a primeira celebração pública no mesmo ano. Assim, foi organizado o espaço com vários aspectos, o religioso através do templo e do santuário, o cultural pela da biblioteca, o econômico sustentável, com o plantio do que consomem, as ervas que acabam por formar uma farmácia viva. A vila é um complexo de preservação do politeísmo ao redor de todo o mundo.

No contexto brasileiro extremamente rico e diverso, não há influência apenas indígenas, há também influência europeia, africana, asiática e árabe, o que faz do Brasil uma tradição multicultural. O Piaga foi dividido em dois grandes grupos, o da corrente da terra e a corrente colona. Na da Terra há cinco panteões nacionais: a linha dos encantados, seres que não passaram por um processo de morte como o caipora, o boto, o curupira, que não são totalmente humanos; a linha dos seus nativos, como os deuse Jaci e Guaraci, divindades que têm origem em diferentes tribos indígenas do país; a linha das almas, são pessoas humanas que ascenderam ao terem um morte marcante e se tornaram almas benditas; a linha piaga, que são divindades autóctones da região do meio norte do Brasil, como Mestre Buriti e outras divindades da mitologia e a linha do culto índio, que são os ancestrais indígenas.

A corrente colona é um conjunto de divindades estrangeiras, em que há quinze linhas diferentes. Assim que um membro se consagra, ele escolhe uma das linhas da corrente da terra, com a responsabilidade de zelar por ela, geralmente indo para aquele grupo de divindades ao qual sente mais afinidade, seja no romano, grego, nórdico entre outros.


“Eu sempre tive uma grande afinidade com a magia. Nem todo pagão é bruxo, mas eu, além de ser, me considero um bruxo, um praticante da feitiçaria e da magia. Sempre foi algo natural pra mim, fui criado em um ambiente católico mas rodeado de outras práticas religiosas. Sempre levei os santos para o lado mais místico. As religiões neopagãs reconhecem essa prática como prática de magia”.

O paganismo Piaga surgiu com objetivo de unir todos, para criar um eixo dentro da diversidade, para ter uma unidade. Por morar em um estado muito católico, era difícil para Rafael encontrar praticantes iguais a ele. Todos os ocultistas e pagãos que encontrava eram divididos, por isso criou o paganismo Piaga, para unir todos eles. Hoje, apesar de não ser muito conhecida, a Vila Pagã é uma comunidade tida como exemplo de comunidade mágica.


Se o gringo gosta por que eu não gostaria?

Nem só de beleza vivem as flores. A velocidade e a facilidade com que a tecnologia trouxe a propagação de informações, também deu visibilidade à comunidade ocultista de diversos países. Religiões neopagãs, criadores de conteúdos digitais e o próprio cinema hollywoodiano foram centrais para que houvesse esse destaque. Religiões européias, como o helenismo da Grécia ou o neopaganismo nórdico, e práticas religiosas fechadas, como a do povo romani (conhecidos como ciganos), vêm sendo romantizadas, espalhadas aos quatro cantos do planeta. O ponto em comum de todos eles é o orgulho que o povo tem de sua história e práticas herdadas de seus ancestrais. No Brasil o buraco é mais embaixo.

O que ocorre é uma desvalorização do passado e do presente pelos brasileiros, do que o país tem a oferecer. Muitos preferem consumir produtos internacionais, certos de que, por serem de fora, são melhores. Essa desvalorização da cultura tem seu início datado da vinda dos portugueses, uma influência eurocentrada já pré-concebida trazida pelos colonos. Com a consolidação do capitalismo no Brasil colônia, produtos trazidos de países de maior influência econômica e militar da europa e da américa do norte, com ênfase dos Estados Unidos.

Se tornou comum as pessoas darem mais valor aos produtos cinematográficos internacionais e estigmatizar o cinema brasileiro, menosprezar ainda a cultura nacional. Por exemplo, em pesquisa realizada pelo Itaú Cultural em 2021, 19% dos 2,2 mil entrevistados nunca assistiram a um filme brasileiro no cinema. Nas plataformas de streaming, 22% só assistiram conteúdo estrangeiro.

No Brasil há vários ocultistas que preferem seguir vertentes pagãs de outros países, seguir receitas mágicas estrangeiras, se identificar com a história de outros países. “Como quem escolheu esse caminho espiritual, eu devo dizer que fico um pouco incomodada de ver outras bruxas brasileiras que decidem abraçar outros panteões que não são parte da nossa cultura. Não que isso seja proibido — a pessoa pode — só que nem passa pela cabeça dela olhar primeiro para o que é nosso. Nossa cultura também é válida, também é mágica, também tem elementos que a gente não precisa procurar fora, a gente pode se quiser, mas não precisa”, conta a bruxa Aster.

Apesar de tudo, mais e mais pessoas têm abraçado a magia brasileira, encontrado a si mesmas nas práticas e encantos da terra. Assim como tem acontecido com os crescentes movimentos de valorização da cultura, bruxas brasileiras de todos os estados, como Aster, têm tido a mágica do Brasil como um meio de se conectarem consigo mesmas e com a terra em que vivem. “A bruxaria foi uma porta de reconexão com a minha cultura e a minha origem”.


Paganismo / pagã

O paganismo é um conjunto de práticas e religiões pagãs; pagã é o termo criado pela Igreja Católica durante a Idade Média para denominar religiões politeístas (que não seguem um único deus). A bruxaria, apesar de dividir pontos em comum — como o culto à natureza — é um pouco diferente. Ela é comumente definida como um ofício individual, e não uma crença propriamente dita.

Como todo trabalho, é dividido em áreas, vertentes. “É muita informação, são muitas coisas que você pode estudar, aprender e se aprofundar. Por exemplo, eu optei pela magia folclórica, em inglês Folk Magic. Tem várias coisas que você pode aprender: lidar com ervas, aprender sobre uma cultura específica, como no caso a minha origem brasileira, você pode se conectar com elementos da natureza, a Lua. Também existem vertentes muito mais ligadas a espíritos, você pode aprender a como se conectar espiritualmente, culto aos ancestrais”, explica Aster. Algumas linhas de práticas e crenças mais comuns: bruxaria natural, culinária, e bruxaria ancestral.

A bruxaria natural se refere ao uso, em rituais elaborados ou simples, e no dia a dia, de ervas naturais, produtos ecológicos e sustentáveis, viver “verde”; é ver e sentir a magia na natureza. Não seria exagero dizer que quem segue esse caminho são abraçadores de árvores exímios.

A bruxaria culinária se explica pela sua própria denominação: manifestar a magia através da comida. A cozinha é o espaço sagrado das bruxas cozinheiras, seu altar e local de trabalho. Uma pitadinha de alecrim, uma marinada no suco de laranja, uma dose de amor e bum! O feitiço está lançado. Seus caldeirões quase sempre estão cheirando a comida boa.

E a bruxaria ancestral? Uma das práticas mais antigas, é a conexão da bruxa com seus ancestrais e parentes que já se foram. Se reconectar com suas raízes, honrar suas origens, tudo faz parte do pacote. De maneira geral, a bruxaria como um todo é ancestral. Ela se baseia no autoconhecimento, e que maneira melhor de se conhecer do que saber de onde veio?

A bruxaria é a manipulação de uma determinada energia, com o uso de algumas ferramentas, podendo ser ervas, palavras ou feitiços, para concretizar um objetivo mudar uma energia, ou seja, a bruxaria é a conexão que se tem através dos recursos que a natureza nos oferece para moldar uma realidade de forma. “É uma prática espiritual que gira em torno da independência, da autonomia, de descobrir a si mesmo, de não depender”.

“É uma fonte de conhecimento quase inesgotável, sempre tem alguma coisa pra aprender. Desde que comecei eu não parei de buscar — e encontrar — mais conhecimento sobre isso”.


Uma bruxa entre nós!


Não é novidade que as lendas urbanas são parte importante da história de uma cidade. Mato Grosso do Sul é um estado recheado de histórias assustadoras, como o Come Língua, a Dama do Castelinho, e o Pé de Garrafa. O que elas têm em comum? A fantasia. Independentemente de qual versão você escutar, todas possuem uma característica que mexe com o imaginário: os sussurros e lamentos dos mortos, uma criatura horrenda com garras e dentes tão afiados que conseguem cortar a carne como se fosse manteiga.

Apesar da quantidade de histórias, um caso em especial na cidade de Campo Grande se tornou tão famoso e conhecido que se tornou uma lenda urbana, não pelo um aspecto misterioso e fantasioso, mas pelo horror, a crueldade e frieza do crime. O que instigou medo e angústia no mais velho dos corações, em todos os adultos da cidade pacata? A história é real.

Em janeiro de 1969, a morte de quatro crianças foi denunciada. No mesmo mês, seis corpos pequenos e imaturos foram desenterrados de covas rasas no pequeno bairro Sapolândia. Onze, encontradas vivas, estavam em um estado de desnutrição, em situações de vida desumanas.

De acordo com testemunhas, Célia de Souza, a mulher por trás dos crimes, era “macumbeira” e junto do seu marido, João Luiz, matava crianças e usava seus órgãos, pele, cabelos, e tudo que conseguia em rituais de “saravá” — ambos os termos usados de maneira pejorativa e preconceituosa, apesar de seus significados serem totalmente opostos e distintos de tal implicação. Célia foi mesmo uma bruxa, então?



Célia sentada ao lado dos corpos desenterrados das crianças (arquivo Campo Grande News)


Não de acordo com a polícia. De acordo com os registros da época, consta que o casal pegava menores de idade para cuidar, mas abusavam delas, com espancamentos, não oferecia alimentação nutritiva e suficiente e colocou eles para viver em espaços insalubres de sua casa. Hoje, o local é motivo de pavor, considerado assombrado.

Há 124 anos, uma relação foi construída a partir desse crime, entre os habitantes de Campo Grande e a palavra “bruxa”, algo que acontece ao redor de todo o globo. O termo é associado a coisas ruins, ao medo irracional do sofrimento. Muitos influenciadores digitais têm usado as redes sociais para ressignificar a imagem negativa que os ocultistas possuem, trazendo conhecimento para pessoas leigas sobre o assunto.

No final do dia, o brasileiro está em contato com seu lado mágico constantemente, seja ao dar três batidinhas na madeira ou rezar para que o ônibus de fim da tarde esteja quase vazio. Esses hábitos enraizados no dia a dia são frutos do passado do Brasil, como explica e reitera Aster. “A magia brasileira é única, é uma combinação de várias coisas diferentes; é um retrato da história do Brasil. Para entender nossa magia é necessário entender nossa história, porque hoje a consequência, o resultado de tudo isso se vê na nossa magia e inclusive na nossa religiosidade”.

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